quinta-feira, 27 de abril de 2017

HOMENAGEM DE UM CULTO JORNALISTA PAULISTA A SEU AMIGO MARINHEIRO CEARENSE NATO: UMA AMIZADE QUE DEIXOU ALÉM DA SAUDADE, A CERTEZA DE QUE UMA AMIZADE DE VERDADE PODE SUPLANTAR LAÇOS CONSANGUÍNEOS QUE NEM SEMPRE SIGNIFICA UMA FIDELIDADE VERDADEIRA

                                                  TEXTO DE DIRCEU PIO                                                   

                                              

TRISTEZA, MEU MARINHEIRO SE FOI....
“Ô, marinheiro marinheiro
Marinheiro só
Ô, quem te ensinou a nadar
Marinheiro só
Ou foi o tombo do navio
Marinheiro só
Ou foi o balanço do mar
Marinheiro só” (Caetano Veloso)

Ele, suponho, nunca esteve só! Teve uma família que o amava e muitos amigos que o tinham como irmão... Mas eu tenho de dizer de alma constrangida – meu marinheiro se foi e era um só... não haverá outro como ele...
Como diria sua filha, Marizilda, ele se foi sem pedir licença aos que o amavam... “Saiu à francesa!” Teve, felizmente, a morte com que todos sonhamos:  dormia, ao lado da esposa, a cearense Maria Alzionete Fernandes Alves Gonçalves.
Aconteceu no dia 6 de dezembro de 2016, em sua residência no bairro  Nova Brasília, Imbituba, Santa Catarina, uma cidade cercada por mar e lagoas, que ele escolhera para terminar seus dias...eu soube faz pouco tempo...Tenho minhas razões: por motivo de saúde, estou no meio do quarto ano sem visitar a Barra da Ibiraquera.
Pensem num lugar deslumbrante, essa é a Barra da Lagoa da Ibiraquera onde eu, paulista, passava 30 dias de férias por ano...não sou nada bobo não, muito menos ele, o meu marinheiro-do-coração.
A lagoa tem 14 quilômetros de comprimento e, digamos, dois mil metros de largura... No ponto em que esses dois mil metros se estreitam, forma-se um canal que liga a lagoa ao mar. É o que chamam de barra...
Do lado direito de quem fica de costas para o mar, nasceu devagar devagarinho uma vila; no início, era uma vila de pescadores, hoje virou um balneário metido a besta... era ali que nos encontrávamos uma vez por ano, foi ali que nos tornamos amigos, parceiros da bocha e, de vez em quando, parceiros de pequenas viagens pela região com o seu interminável roteiro de atrações,  como, por exemplo, a Várzea do Cedro com seus rios encachoeirados, terra da Santa Ernestina, de onde sempre saiu o maior número  de vocações sacerdotais do Brasil...A gente entra de carro no Vilarejo e vai passando,  estação a estação, pela Via Crucis... Cada parada da via é identificada por uma cruz de madeira e um canteiro de flores. Impressionam a mística e a beleza do lugar...
Há também na região a Lagoa do Imaruí com as suas dezenas e dezenas de recantos e vilarejos de forte influência açoriana... e ainda, o Balneário das Águas, onde uma piscina de água termal (35 graus centígrados) aguarda os visitantes em Santa Rosa de Lima...não, eu nunca estive errado em dizer que Deus, antes de criar o mundo, esteve ali na região de Imbituba, para se encher de inspiração..
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Mas, falemos de nosso herói: ele fechou os olhos aos 85 anos (digo assim, porque homens como ele não morrem, ficam pairando no ar, fecham os olhos, visitam os amigos e enternecem filhos e netos por muito e muito tempo). Nasceu em Acopiara, Ceará (não por acaso, a Rua de Nova Brasília, em Imbituba, onde passou longos anos de tranquilidade, recebeu  o nome de sua cidade natal, por iniciativa do vereador Antônio Pedro Isaac que já reconhecia a sua importância como cidadão).

                                                          O ALISTAMENTO

Em Fortaleza, incentivado pela tia-sócia fundadora dos bordados Mundica Paula, alistou-se na Marinha em 06 de fevereiro de 1950 e ali fez carreira de marinheiro até entrar para reserva no dia 04 de janeiro de 1984, como 2º Tenente.
Seu nome de batismo era Artur Clemente Gonçalves... Com alguns anos de Marinha, incorporou outro nome, um misto de respeito, admiração e cordialidade: foi chamado de “Mestre Artur” até o fim da vida.
Como todo bom marinheiro, começou sua carreira na Marinha com intensos aprendizados. Ficou por um tempo em Fortaleza, foi fazer um curso de aperfeiçoamento em Natal e em março de 1951 já era Patrão da Lancha Almirante M. Rêgo, no Rio de Janeiro... Em 1974, transferiu-se para Aratu, (Salvador)  na Bahia, onde permaneceu por dois anos...voltou para o Rio de Janeiro em 1977 e ali ficou por mais alguns meses até se transferir para Imbituba, Santa Catarina...
Em agosto de 1953, por merecimento, ganhou a Viagem Ouro, disputadíssima na Marinha e foi conhecer o mundo, começando pelas Ilhas Canárias (Las Palmas), passando em seguida pela Madeira (Funchal); Ilhas Canárias (Las Palmas); Marrocos Francês (Casablanca); Irlanda do Norte (Belfort); Inglaterra (Londres); Noruega (Oslo); Dinamarca (Copenhague); Finlândia(Helsinki); Suécia(Estocolmo); Alemanha (Hamburgo); Holanda (Amsterdam); Bélgica (Antuérpia); França (Le Havre); Espanha (Barcelona); Itália (Nápoles); Grécia (Pireu); Turquia (Istambul); Israel (Haifa); Egito (Alexandria); Algéria (Argel); Tânger (Tânger); Portugal (Lisboa); Canadá (Halifax); Estados Unidos (Nova York); Estados Unidos (Filadélfia); México (Canadá); Cuba (Havana); Panamá (Colón); República Dominicana; Venezuela (La Guaira); Trinidad Port. Of Spain.

                                              ERA COMO VIAJAR COM ELE

Na verdade, eu tive o privilégio de acompanhá-lo país a país, porto a porto, pelas animadas conversas sentado na frente dele e da esposa naquelas tardes felizes pela Barra da Ibiraquera...sua casinha de “veraneio”, simples, de madeira, ficava a meio caminho entre a minha casa de praia e a lagoa...
Sua casa era minha  parada obrigatória, entrava, me abancava e puxava prosa com Mestre Artur...sorvia um café forte, a gosto dos paulistas (dona Alzionete sabia), comia bolos e broas de polvilho, uma delícia...meu marinheiro nunca  decepcionou...ele desfiava suas histórias de viagens, de proezas no comando de embarcações de renome, de aventuras...
“Já manobrei  o Porta Aviões Minas Gerais”, contava sem rompantes, mas com os olhinhos marejados de saudade... Foi também na Barra da Ibiraquera que eu conheci sua família, a esposa Alzionete, suas duas filhas Marizilda e Débora, e seus genros, Jaison Cardoso e Mariton Stracke Araujo, memorável companheiro de bocha...Gente especialíssima, todos eles !
Ah, inesquecíveis são suas duas netas, filhas do casal Marizilda/Mariton, Luana e Beatriz, hoje mocinhas...me viam e queriam colo e conversa; saíamos pra passear, visitava com as duas meus vizinhos de praia, cativados instantaneamente por elas,  duas meninas  adoráveis !
Meu marinheiro se foi e eu fico por aqui, remoendo minhas lembranças...E nas lembranças ainda o vejo arremessando a tarrafa na Lagoa, de dia, atrás de tainhotas e carapicus e à noite, munido de uma lamparina, atrás dos deliciosos camarões da Ibiraquera;  vejo-o também chegando à cancha de Bocha onde estavam sempre a sua espera os amigos Jaime, Volnei, Sadi, Fermiano, Alcebíades, Paulo, Zequinha, Rodrigo, Ciço, Zézu e tantos outros de um convívio alegre, desprendido, que as vezes varava noite e madrugada...enternecedoras lembranças !

                                                   


                                      

"AMIZADES COMO A DO MEU AMIGO DIRCEU PIO E SEU AMIGO MARINHEIRO "MESTRE ARTUR", SÃO RARAS, TENHO O PRIVILÉGIO DE DIZER QUE TENHO UM AMIGO ASSIM, JÁ APRONTAMOS POUCAS E BOAS JUNTOS, ESPERO QUE ELA PERDURE ATÉ O FIM DE NOSSAS VIDAS, MAS QUE ANTES DISSO POSSAMOS SENTAR E CONTAR AOS NOSSOS FILHOS E NETOS O QUANTO É BOM TERMOS ALGUÉM PARA DIZER ESTE É MEU AMIGO DE VERDADE, VAMOS CULTIVAR NOSSAS AMIZADES, QUEM UM AMIGO DE VERDADE, NUNCA ESTÁ SÓ."

POSTADO POR: LUCIANO MELO - 27/04/2017

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